domingo, 29 de agosto de 2010

Diz que a canção já não é uma arma

Artigo do Diário de Notícias
29/08/2010
A cantiga já não é uma arma
por RUI PEDRO ANTUNES

PCP comemora 25 anos da 'Carvalhesa', numa altura em que música e política se misturam cada vez menos. Hinos já pouco têm a ver com ideologia defendida dos partidos, e as músicas dependem cada vez mais das estratégias das agências de comunicação.
A Festa do Avante! decidiu este ano homenagear uma camarada de viagem: a Carvalhesa. Mas se a música oficial da "festa" tem mantido o seu estatuto intocável ao longo de 25 anos, a música e a política andam há muito desavindas. Como explicou ao DN o politólogo António Costa Pinto, "a música enquanto arma de mobilização politico-ideológica tem vindo a diminuir". Ou seja: hoje em dia, a cantiga já não é uma arma.
E se a reconhecida Carvalhesa será no início de Setembro tocada por orquestras sinfónicas, "a maioria dos militantes nem os hinos dos partidos conhece", explica o professor de Ciência Política do ISCTE (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa). Com a transição para a democracia, a importância da música tem vindo a diminuir. O maior corte foi "nos anos 80, com a profissionalização dos partidos, passaram a ser as agências de comunicação a escolher as músicas, que já nem sequer tem uma componente ideológica", lembra Costa Pinto.
Aliás, é isso que se tem verificado nos últimos anos. O PS colocou A Internacional na gaveta e tem optado por tocar músicas com acordes triunfais nos seus comícios à americana. Nos tempos em que António Guterres era secretário- -geral, uma música de Vangelis tornou-se numa imagem (ou melhor, som) de marca do partido. Já a entourage de José Sócrates, o mesmo a quem a oposição já chamou de "animal feroz", optou por fazer política ao som da música Now we are free, que faz parte da banda sonora do filme Gladiador.
Quanto ao PSD, cujos carros em tempos de campanha não se cansam de ecoar Paz, pão, povo e liberdade, tem na letra do seu hino uma contradição quase tão grande como a que existe entre o nome e a ideologia do partido. A letra e a música do conhecido hino são da autoria de José Calvário, mas este acabaria por ser interpretado por Paulo de Carvalho.
"Os hinos dos partidos seguiram a conjuntura de formação dos partidos políticos portugueses, que nasceram à esquerda, mas acabaram por não acompanhar a mudança ideológica", justifica Costa Pinto. Aliás, no PSD, quando se tentou fazer da música uma arma nas legislativas de 2005, o feitiço virou-se contra o feiticeiro. Santana Lopes perdeu as eleições e ganhou uma alcunha: "Menino guerreiro". O primeiro verso, que dizia que "um homem também chora", acabou por ser um mau presságio para a derrota eleitoral que se seguiu.
Menos tradição musical tem o CDS, cujo hino conta com a voz de Dina, numa letra da autoria de Rosa Lobato Faria.
Criado muito depois dos tempos em que luta também se fazia pela música, o Bloco de Esquerda recupera nos seus comícios as canções de intervenção do 25 de Abril, embora também não ignore projectos revivalistas como os Humanos. A música Muda de Vida já chegou a ser um habitué nos encontros bloquistas.
Escassa na política é a música de raízes suburbanas, embora o hip-hop já tenha sido o estilo de música utilizado como hino em pelo menos duas campanhas eleitorais. Depois de o PS o deixar a falar sozinho, Narciso Miranda tentou o regresso à Câmara de Matosinhos, apostando no hip-hop para o hino.
Este estilo de música não é novo na política, pois na última vez que José Sá Fernandes se candidatou à Câmara de Lisboa nas listas do Bloco de Esquerda, convidou o rapper Júnior para fazer o seu hino, cujo refrão dizia "O Zé faz falta. O Zé faz muita, muita falta". Já nas últimas eleições, o "Zé" preferiu estar em sintonia com António Costa, que fez um comício-concerto com vozes como Sérgio Godinho.
Nas mesmas eleições, Santana Lopes, já farto da imagem do Menino Guerreiro, ficou-se pelo Lisboa, Lisboa dos Pólo Norte. O eterno enfant terrible do PSD conseguiu ser menos ousado que a campanha de Rui Rio no Porto, que não só intitulou a carrinha de campanha de Marlene, como a música mais vezes entoada tinha como título, nada mais nada menos, que "Você não vale nada, mas eu gosto de você".

Uma raridade do Fausto

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

My ancestors slapped me in the face and said "GO!"

Os Arrested Development nasceram em Atlanta (EUA) no início dos anos 90. Em 1992 Spike Lee convidou-os para fazerem uma canção para o seu filme "Malcom X". Eles fizeram este "Revolution", canção "positiva", afirmativa e "cool" como todas as dos Arrested Development, mas especialmente politizada. Em particular evocando os combates contra a violência racista e a discriminação dos negros norte-americanos.
Lembrando as lutas de ontem para mudar tudo hoje. E fazendo um apelo à acção: "My ancestors slapped me in the face and said "GO!"

Aqui vai a letra:

Brothers and Sisters
Let me share with you some news
As I sit on my plush couch watching the news
There has been a rude awakening
That I have marched until my feet have bled;
And have rioted until they called the Feds
What's left my conscience said?
What's left my conscience said? GO!

As I look out my window I can see the little ones
Playing amongst each other with the water guns
In pure poverty
Generations of good people in cycles of poverty
It bothers me so I ask myself (I say)
Are you doing as much as you can for the struggle? (No)
Am I doing as much as I can for the struggle? (No)
Then why do I cry when my people are in trouble? (Yo!)
My ancestors slapped me in the face and said "GO!"
Harriet Tubman told me to get on up!
Marcus Garvey said to me, bro, you get on up!
My brother malcolm X, need I say more
It ain't like we've never seen blood before,
Come on, let's talk Revolution, now!

(Oh, my people say, oh my brothers say, oh my sisters say, HEY! Oh, my people
say/ come on let's talk about a Re-volution)

I seen blood on one Malcolm as one shot him
I see tears, because now it seems we've forgot him
I've seen years of people struggling for a solution
Like restitution; excuses, no more no more confusion
Come on, come on, let's talk right
Talk up talk up, but don't talk up up all night
There's got to be action if you want satisfaction
If not for yourself, for the young ones (the children!)
The US, the UN, we can't allow ya—
to tellustthe kidinthegetto isnotasimportantasthiskidin Bosnia [sic]
I ain't with it; just forget it
We can't even debate if you don't understand our situation
You don't want us to go get a gun now
You don't like to see people runnin' around now, do ya?
Yet and still you want to live like '90210', while we scream out "Yo FREEDOM"!
My grandmother has a goal we have wasted
You best acquire a taste for somethin' you never tasted
So people, let us wear our pallets
it's either the bullet or the ballot; come now

Revolution now

Now see, I understand what my people have said
They tell me to FIGHT— fight for the answers to our dead
For Harriet Tubman, MOVE organization, David Walker, the Black Panthers
Kwame and Kuma, Marcus Garvey, Jane Pitman
Revolution!


terça-feira, 24 de agosto de 2010

Uma canção de Maio de 68

"Digam-me, como se chama
este jogo que estão a jogar?
A regra parece nova:
que jogo, que jogo singular!"

Chanson du conseil pour le maintien des occupations
(Canção do conselho para a manutenção das ocupações, letra de Alice Becker-Ho, Maio de 1968. A partir da canção "Nos soldats à La Rochelle", cantada por Jacques Douai)



Rue Gay-Lussac, les rebelles
N’ont qu’les voitur’s à brûler.
Que vouliez-vous donc, la belle,
Qu’est-ce donc que vous vouliez ?

Refrain :

Des canons, par centaines.
Des fusils, par milliers.
Des canons, des fusils,
Par centaines et par milliers.

Dites-moi comment s’appelle
Ce jeu-là que vous jouiez?
La règle en paraît nouvelle:
Quel jeu, quel jeu singulier!

La révolution, la belle,
Est le jeu que vous disiez.
Ell’ se joue dans les ruelles,
Ell’ se joue grâce aux pavés.

Le vieux monde et ses séquelles,
Nous voulons les balayer.
Il s’agit d’être cruels ;
Mort aux flics et aux curés.

Ils nous lancent comme grêle
Grenades et gaz chlorés.
Nous ne trouvons que des pelles
Et couteaux pour nous armer.

Mes pauvres enfants, dit-elle,
Mes jolis barricadiers,
Mon cœur, mon cœur en chancelle,
Je n’ai rien à vous donner.

Si j’ai foi en ma querelle
Je n’crains pas les policiers.
Mais il faut qu’ell’ devienn’ celle
Des camarad’s ouvriers.

Le gaullisme est un bordel,
Personne n’en peut plus douter.
Les bureaucrat’s aux poubelles :
Sans eux on aurait gagné.

Rue Gay-Lussac, les rebelles
N’ont qu’les voitur’s à brûler.
Que vouliez-vous donc, la belle,
Qu’est-ce donc que vous vouliez?

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

"Tanto mar" e a revolução portuguesa de 1974

A primeira versão de "Tanto mar", de Chico Buarque, dedicada à revolução portuguesa (o excerto é de um filme de Sérgio Tréfaut):



E a segunda versão, em 1978, precedida de uma pequena mas clara explicação de Chico Buarque. Porque foi censurada a primeira versão? Porque mudou a letra depois?

Spanish bombs

O punk que não é estúpido põe a memória a trabalhar. Busca no passado não apenas bandeiras, mas uma história de transformação. Como esta canção dos Clash em que se invoca a Guerra Civil Espanhola: Spanish Bombs. "Can I hear the echo from the days of 39?"



Spanish songs in Andalucia,
the shooting sites in the days of ’39.
Oh, please leave, the VENTANA open.
Federico Lorca is dead and gone:
bullet holes in the cemetery walls,
the black cars of the Guardia Civil.
Spanish bombs on the Costa Rica -
I’m flying on in a DC-10 tonight.

Spanish bombs; yo te quiero infinito.
Yo te quiero, oh mi corazón.
Spanish bombs; yo te quiero infinito.
Yo te quiero, oh mi corazón.

Spanish weeks in my disco casino;
the freedom fighters died upon the hill.
They sang the red flag,
they wore the black one -
but after they died, it was Mockingbird Hill.
Back home, the buses went up in flashes,
the Irish tomb was drenched in blood.
Spanish bombs shatter the hotels.
My señorita’s rose was nipped in the bud.

Spanish bombs; yo te quiero infinito.
Yo te quiero, oh mi corazón.
Spanish bombs; yo te quiero infinito.
Yo te quiero, oh mi corazón.

The hillsides ring with “free the people” -
or can I hear the echo from the days of ’39
with trenches full of poets,
the ragged army, fixing bayonets to fight the other line?
Spanish bombs rock the province;
I’m hearing music from another time.
Spanish bombs on the Costa Brava;
I’m flying in on a DC-10 tonight.

Spanish bombs; yo te quiero infinito.
Yo te quiero, oh mi corazón.
Spanish bombs; yo te quiero infinito.
Yo te quiero, oh mi corazón,
oh mi corazón,
oh mi corazón.

Spanish songs in Andalucia:
mandolina, oh mi corazón.
Spanish songs in Granada, oh mi corazón,
oh mi corazón,
oh mi corazón,
oh mi corazón.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

A propósito de resistentes

Eis uma banda punk do País de Gales (sim, eles também têm).
The Partisans nasceram em 1978.
A voz diz o texto. Punk explícito, directo e popular, que não se arrepende de nada.



A letra que se percebe...

POWER AND GREED
I am so tired of living in this place
Just wanna get out of the rat race
Don't want to live any monarchist dream
Don't wanna live here because I am anti Queen
I'm anti Queen
I cant take much more...
I'm anti Queen and I don't give a shit about what they preach
The Royal family takes the money that you need
To pay for...........and to pay for the greed
So do you think this systems fair
When you can't afford the clothes you wear
They got mansions and so much land
No power its all a game
What we need to do is take away their rights
What we need to do is stand up and fight
So don't believe a word they say

Canção da resistência grega

A resistência grega armada ao fascismo começou em 28 de Outubro de 1940 com um "não" ("Ohi") à rendição a Mussolini por parte do primeiro-ministro da época. Entretanto cria-se o E.L.A.S. (exército popular de libertação da Grécia), ligado ao Partido Comunista Grego. Seguiu-se uma dura guerra contra a Itália e contra a invasão alemã (a partir de 1941 e até à libertação em 1945). Segue-se uma guerra civil (1946-49) entre o governo oficial (apoiado pelos EUA e o Reino Unido) e o partido comunista (exército Democrático da Grécia, apoiado pela Jugoslávia, Bulgária e Albênia). A guerra fria a começar bem quente na Grécia. Feridas grandes no povo grego, até décadas depois.
Aqui está uma das canções mais famosas da resistência, conhecido como hino do E.L.A.S.



Uma tradução em inglês:

With my rifle at the shoulder
in cities plains and villages
I clear the road for freedom
I lay her bay-leaves and she passes.

March E.L.A.S. for Greece
righteousness and freedom
in mountainpeaks and in valleys,
fly, fight with your heart

A song is your breath
while in the ridge you walk
and from your voice resound
hearts and plains
E.L.A.S. E.L.A.S.

With thousand names one charm
akritas or armatolos
rebel, thieve, lad
it's always the same people

Everywhere the Homeland has sent me
guard and a revenger too
and from my impetus rises
a new free life.

Damn him that he will threaten me
with slavery and shame
death I have suppressed,
I do not know what fear means.

With my rifle at the shoulder,
the day will shine, it wont be long
to open the street for freedom,
in order to pass all of the land.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Hip-Hop pra fazer Revolução

O coletivo de hip-hop “Lutarmada” tem forte atuação ao lado dos explorados e oprimidos. Suas músicas denunciam todo o tipo de discriminação, exploração e alienação. Um dos grupos que formam o coletivo é "O Levante", que [lançou em 2007] o CD "Temeremos mais a miséria do que a morte". As letras são explícitas em sua opção pela luta popular e, sem qualquer vacilo, pela revolução. Leia a entrevista que um de seus integrantes nos deu. É o Gas-PA.

Como, onde e quando surgiu o coletivo? Quais são seus objetivos?
Surgiu em um morro da zona norte do Rio, em 2004. Nosso objetivo é, através da arte e de outras formas de entretenimento, incentivar na juventude de bairros periféricos a reflexão e interferência na realidade que ela vive. São oficinas artísticas, exibição de filmes e eventos culturais, como o anual Hip-Hop Ao Trabalho, que acontece todo 1º de maio, em Costa Barros. Nós montamos a estrutura, a comunidade vem curtir o evento que, além de música, tem BMX, Trançagem - para as pretinhas terem a chance de perceber que não precisam babar ovo das brancas para serem bonitas - dança, graffiti, vídeos e recebem o nosso manifesto do Hip-Hop ao trabalho, que é escrito com uma linguagem bem apropriada para aquela população formada em sua grande maioria por analfabetos funcionais. Se a burguesia se utiliza dessas ferramentas pra dominar, usaremos pra mobilizar.

No CD "Temeremos mais a miséria do que a morte", de O Levante, vocês defendem a revolução como saída? Que tipo de revolução seria?
A total transformação da sociedade. Na mais profunda raiz. Não deixando de pé a mais-valia, o racismo, o machismo, as concentrações agrária e imobiliária, a herança, a propriedade privada de todos os meios de produção e de comunicação. Por aí.

Vocês dizem que o microfone é sua arma? A música pode revolucionar?
Contribuir para a revolução, sim. Para manter sua hegemonia a classe dominante tem a igreja, a escola, jornais, revistas, TV, polícia, Forças Armadas...e música. Já fui ingênuo o suficiente pra acreditar que só com a música eu estaria contribuindo enormemente para a revolução. Agora não dá mais pra eu pensar assim. A música de O Levante e dos outros grupos que formam o Lutarmada são apenas uma trincheira na guerra de posições. Tanto é que nossa militância dá-se muito menos nos palcos e nos estúdios do que na pista. Enquanto eu escrevo isso, tem gente do Lutarmada na greve dos professores do estado. Já marchamos pro DF em defesa da reforma agrária, já ocupamos usina que emprega mão-de-obra escrava, já teve gente nossa ocupando prédio abandonado...à esquerda e avante.

Como vocês estão vendo toda essa violência contra os pobres no Rio, em outras grandes cidades e no campo?
Sistemática, funcional, classista.

A música "Luta pelo amor, amor pela luta" fala de uma mulher militante. Um marxista inglês disse uma vez que a liderança revolucionária ideal teria que ser mulher, jovem, negra e homossexual. O que vocês acham disso?
Esse é o modelo de vítima de todas as formas mais freqüentes de opressão da nossa sociedade e, portanto, com mais elementos para a indignação, eu sei. Só que no caso dessa música eu não pensei nisso. Essa é uma história de amor que, por mais que pareça bizarra, foi verdadeira. E ela é mulher, jovem, preta, sim. mas só isso.
De quais movimentos sociais vocês participam?
Frente de Luta Popular (FLP) e uma rede de educação popular que, no Rio, é formada, além de nós, pelo MST, MTD e a Pastoral da Criança.

Fonte: Revolutas
http://www.revolutas.net
17/10/2007

Não buzine que eu estou paquerando (Tom Zé em 1968)



Sei que o seu relógio
Está sempre lhe acenando
Mas não buzine
Que eu estou paquerando

Eu sei que você anda
Apressado demais
Correndo atrás de letras,
Juros e capitais
Um homem de negócios
Não descansa, não:
Carrega na cabeça
Uma conta-corrente
Não perde um minuto
Sem o lucro na frente
Juntando dinheiro,
Imposto sonegando,
Passando contrabando,
Pois a grande cidade não pode parar

Sei que o seu relógio está sempre lhe acenando,
Mas não buzine, que eu estou paquerando

A sua grande loja
Vai vender à mão farta
Doença terça-feira,
E o remédio na quarta,
Depois em Copacabana e Rua Augusta,
Os olhos bem abertos,
Nunca facilitar,
O dólar na esquina
Sempre pode assaltar
Mas netos e bisnetos
Irão lhe sucedendo
Assim, sempre correndo,
Pois a grande cidade não pode parar,